terça-feira, fevereiro 06, 2007

BACTÉRIAS TÊM O MENOR GENOMA DE TODOS OS SERES VIVOS, DIZ ESTUDO

Micróbios vivem em simbiose com insertos e estão a caminho de virar uma simples parte das células dos bichos ou mesmo desaparecer
Duas bactérias, apelidadas de Carsonella rudii e Buchnera aphidicola BCc pelos cientistas, acabam de ter seu genoma (o conjunto do DNA) descodificado, ganhando o título de seres vivos com o material genético mais compacto conhecido. As duas vivem no interior das células de certos insectos, em simbiose com eles -- um negócio que até hoje foi vantajoso para ambas as partes. Mas a perda de pedaços do genoma (que nem sempre foi tão reduzido assim) pode significar que os dias das duas bactérias estão contados. As perspectivas são melhores para a C. rudii: ela deve continuar a existir, mas vai se integrar de tal maneira às células do insecto que virará um simples órgão delas.
Já a B. aphidicola BCc está seriamente ameaçada de simplesmente desaparecer. O seu DNA encolheu tanto que parou de funcionar direito como organismo e se tornou supérflua para seu hospedeiro, já que outro micróbio está fazendo as vezes dela. A extinção parece ser seu destino mais certo.
O tamanho dos genomas é medido em pares de bases (as bases são as "letras" químicas A, T, C e G, que formam o DNA), e qualquer comparação deixa claro o quão minúsculos são os das duas criaturas. A C. rudii, menorzinha, tem só 160 mil pares de bases, enquanto a outra conta com 422 mil -- o genoma humano, por sua vez, ostenta nada menos que 3 bilhões de pares de bases.
Na verdade, é mais fácil comparar as nanicas não com outras bactérias, mas com estruturas internas das células dos organismos superiores que têm DNA próprio, como os plastídios, que coordenam a fotossíntese nas células das plantas e cujo material genético gira em torno de 220 mil pares de bases. A comparação, aliás, não tem nada de acidental, segundo os pesquisadores.
É que tudo indica que, no passado remoto, tanto os plastídios quanto as mitocôndrias, as usinas de energia das células humanas, também eram bactérias que começaram como simbiontes e depois foram incorporados em definitivo aos organismos superiores. A dupla de bactérias de genoma nanico parece estar mais ou menos nesse caminho. Elas até são transmitidas de mães para filhos, como acontece com as mitocôndrias.
"A C. rudii aloja-se no abdômen das fêmeas do insecto hospedeiro, muito perto do local onde são produzidos os ovos", contou ao G1 Nancy A. Moran, da Universidade do Arizona (EUA), que estudou o genoma do micróbio. Ele vive no interior de células especializadas do insecto, que se alimenta de seiva. Segundo Moran, as bactérias são transferidas dessas células especiais para os ovos durante a produção deles.
O insecto hospedeiro se alimenta de seiva, uma fonte relativamente pobre de nutrientes. A bactéria compensa isso produzindo uma série de substâncias essenciais, principalmente aminoácidos (os ingredientes das proteínas), enquanto as células do insecto lhe conferem protecção e um ambiente seguro para se multiplicar. Mas parece que a vida lá dentro é tão boa que o genoma da C. rudii foi perdendo vários genes essenciais para sua sobrevivência em estado livre, provavelmente porque não precisava mais deles. Ela não deveria estar saudável, mas está -- o que sugere que essas funções foram assumidas pelo hospedeiro, que teria inclusive incorporado genes dela.
"Isso é especulativo, mas achamos essa transferência pode ter acontecido", diz Moran. O que sugere que, como as mitocôndrias, a bactéria poderá se tornar um órgão celular, ou organela, no futuro.
Ocaso de simbiose entre a B. aphidicola BCc e uma espécie de pulgão provavelmente vai ter um final bem menos feliz. É o que dizem Vicente Pérez-Brocal que estudou o micróbio.
O que acontece é que, além de perder genes essenciais para sua sobrevivência livre, a bactéria também foi inepta o suficiente para permitir que parassem de funcionar seus genes ligados à produção dos aminoácidos para o hospedeiro. Pior: outra bactéria parece estar criando uma simbiose com o pulgão e fazendo esse serviço, tornando-a desnecessária. É difícil de prever o que vai acontecer, mas o mais provável é que a bactéria compacta desapareça de vez.

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